A influência do Q10 em várias perturbações hormonais
O Q10 tem um papel crucial na renovação energética celular e também como antioxidante que protege o organismo contra o stress oxidativo. As perturbações nas mitocôndrias energéticas das células e o stress oxidativo também podem intervir nos diversos tipos de perturbações hormonais que comprometem a glândula da tiróide, o pâncreas, as glândulas sexuais, pituitária e suprarrenais. Num novo artigo de revisão, publicado em Antioxidants, os cientistas fizeram uma análise mais aprofundada do papel do Q10, focando-se especialmente em hipertiroidismo, diabetes tipo 2 e má qualidade espermática, problemas que podem ser corrigidos através de suplementação.
Q10 é uma coenzima que funciona transportando electrões no processo mitocondrial, em que a energia é quimicamente armazenada na forma de ATP (adenosina trifosfato). O Q10 também está presente nas membranas celulares e nas membranas dos organelos (p. ex., mitocôndrias, lisossomas e retículo endoplasmático). Aqui, o Q10 constitui um excelente antioxidante que protege as membranas contra o stress oxidativo e danos locais provocados pelos radicais livres.
O Q10 é o único antioxidante lipossolúvel que o ser humano consegue sintetizar de forma endógena. Protege as membranas por eliminação directa dos radicais livres e por reactivação de outros antioxidantes, como a vitamina C e a vitamina E. No sangue, o Q10 está ligado ao colesterol. Deste modo, protege o colesterol contra a peroxidação lipídica, que é a causa subjacente da aterosclerose.
O Q10 existe naturalmente como ubiquinona ou ubiquinol, e alterna entre estes dois tipos, consoante o organismo precise de um ou do outro. Uma das formas intervém na síntese energética, ao passo que a outra constitui um antioxidante.
A síntese endógena de Q10 diminui com a idade. Também pode diminuir em consequência de doenças mitocondriais ou da toma de antidislipidémicos.
No seu artigo de revisão, os autores estudam mais aprofundadamente qual o impacto do défice de Q10 e da suplementação com Q10 nas perturbações da tiróide, como doença de Graves e tiroidite de Hashimoto, diabetes, baixa fertilidade, menopausa e síndrome de Cushing. O artigo tem por base, exclusivamente, estudos clínicos realizados em humanos.
- Em muitos estudos, foram administradas, durante três meses, doses diárias de Q10 entre 100-200 mg.
- É fundamental utilizar Q10 de qualidade comprovada, por forma a garantir que as moléculas de Q10 são devidamente absorvidas e chegam às células.
Q10, glândula da tiróide e perturbações da tiróide
A glândula da tiróide produz hormonas tiroideias que regulam a captação de oxigénio celular e a renovação energética. As duas perturbações da tiróide mais comuns são a tiroidite de Hashimoto, que provoca metabolismo lento (hipotiroidismo) e doença de Graves que acelera o metabolismo (hipertiroidismo). São ambas doenças auto-imunes em que as defesas imunitárias atacam diversas regiões da glândula da tiróide.
Os doentes com hipertiroidismo, muitas vezes têm baixos níveis de Q10 no sangue e na glândula tiróide por várias razões. Pensa-se que o défice de Q10 contribui para complicações associadas a hipertiroidismo, inclusive insuficiência cardíaca. Estudos mais pequenos sugerem que a suplementação com Q10 pode melhorar a função cardíaca no caso de hipertiroidismo.
Q10, diabetes tipo 1 e diabetes tipo 2
A diabetes tipo 1 é uma doença auto-imune em que defesas imunitárias atacam as células beta produtoras de insulina, no pâncreas. Já a diabetes tipo 2 é uma doença associada ao estilo de vida, em que os receptores de insulina das células respondem mal à insulina do organismo (insulinorresistência), originando má reabsorção da glicose nas células.
Os diabéticos têm risco acrescido de doença cardiovascular, doença renal, doenças oculares e amputações. Nos dois tipos de diabetes, podem ainda verificar-se disfunção mitocondrial e stress oxidativo. Tem-se observado que, tanto na diabetes tipo 1 como na diabetes tipo 2, os níveis de Q10 estão diminuídos.
No seu artigo, os autores remetem para vários estudos controlados e aleatórios, em que se verifica que a suplementação com Q10 pode melhorar a reabsorção da glicose pelo organismo, reduzir a inflamação e diminuir o risco de doença cardiovascular, neuropatia diabética e retinopatia diabética. Além disso, pode ser prudente fazer uma alimentação indutora de açúcar no sangue estável, com menos hidratos de carbono e mais legumes, proteínas e gorduras saudáveis.
Q10 e fertilidade feminina
A função mitocondrial normal é fundamental para a maturação do óvulo, fertilidade e desenvolvimento fetal. Tem-se observado que as mulheres com função ovárica comprometida, muitas vezes, sofrem de disfunção mitocondrial e stress oxidativo. Há estudos que têm mostrado que a suplementação com Q10, antes da terapêutica para a fertilidade, pode melhorar a resposta ovárica e a qualidade do embrião (primeira fase de desenvolvimento do feto).
Q10 e SOP
SOP (síndrome do ovário poliquístico) é uma das perturbações hormonais mais frequentes na mulher em idade reprodutiva. A SOP caracteriza-se por amenorreia, ciclos menstruais irregulares ou oligomenorreia. Outros sintomas incluem níveis elevados de hormona sexual masculina e presença de inúmeros pequenos quistos (bolsas contendo líquido) nos ovários. Pensa-se que a SOP seja a causa subjacente em 30% dos casos de infertilidade involuntária. Também podem surgir acne e crescimento exagerado de pêlos com distribuição do tipo masculino (hirsutismo), obesidade, diabetes tipo 2 ou doença cardiovascular. Foram realizados estudos em que se administraram suplementos de Q10, isoladamente ou com outras terapêuticas para a fertilidade. Vários estudos sugerem que a suplementação com Q10, durante 2-3 meses, pode melhorar a tolerância à glucose (níveis de açúcar no sangue) e lípidos séricos e baixar os níveis de hormona sexual masculina. Além disso, a suplementação com Q10 pode reduzir o stress oxidativo e os níveis de diversos marcadores de inflamação. Será prudente ingerir alimentos que ajudem a estabilizar os níveis de açúcar no sangue, reduzir o aporte de hidratos de carbono, e ingerir mais legumes, proteínas e gorduras saudáveis.
Q10 e fertilidade masculina
Embora haja muitos factores desconhecidos que concorrem para baixa fertilidade masculina, pensa-se que disfunção mitocondrial e stress oxidativo nos espermatozóides podem intervir. Os espermatozóides precisam de grandes quantidades de energia para chegarem ao óvulo, e é imprescindível que os espermatozóides sejam devidamente protegidos contra o stress oxidativo. Lesão do ADN do espermatozóide pode provocar fragmentação do ADN, o que pode dar origem a rejeição do óvulo fecundado. Os autores do estudo citam estudos em que a suplementação com Q10 foi avaliada quanto ao impacto na qualidade do esperma. Num estudo administrou-se Q10 juntamente com selénio, porque a carência de selénio é muito frequente e porque o selénio optimiza o efeito do Q10. Mencionam ainda um estudo de 80 homens inférteis que fizeram suplementação com Q10, L-carnitina, L-arginina, glutationa, ácido fólico (vitamina B9), vitamina B12, zinco e selénio. Esta terapêutica melhorou significativamente a concentração de espermatozóides, a mobilidade dos espermatozóides e a probabilidade de gravidez.
Q10, menopausa, terapêutica hormonal, e tratamento para a osteoporose
A terapêutica hormonal pós-menopausa pode fazer baixar os níveis de Q10 no sangue e eventualmente aumentar o risco de doença cardiovascular na mulher pós-menopáusica. A pílula anticoncepcional também pode baixar os níveis de Q10, e o mesmo acontece com a toma de bifosfonato que contém nitrogénio (alendronato) que é usado no tratamento da osteoporose na mulher pós-menopáusica. Baixa concentração de Q10 no sangue também pode contribuir para alguns dos efeitos secundários.
Q10, hipófise, glândula pineal, e glândulas supra-renais
Não há muitos estudos científicos do papel do Q10 na hipófise, na glândula pineal e na supra-renal. Contudo, tudo indica que os doentes com síndrome de Cushing apresentam stress oxidativo e disfunção mitocondrial.
Referências bibliográficas
David Mantle and Iain Parry Hargreaves. Coenzyme Q10 and Endocrine Disorders: An Overview. Antioxidants 2023
Jan Aaset, Jan Alexander, Urban Alehagen. Coenzyme Q10 supplementation – In ageing and disease. Mechanisms of Ageing and Development. 2021
Illenia Cirilli et al. Role of Coenzyme Q10 in Health and Disease: an Update on the last 10 years (2010-2020). Antioxidants 2021
Bispebjerg Hospital. Færre kulhydrater forbedrer type 2-diabetikeres evne til at regulere blodsukkeret. Bispebjerg hospital.dk/presse-og-nyt/nyheder/nyhedsarkiv. 2019